Afinal, “pregar Cristo crucificado” é NECESSARIAMENTE o mesmo que falar de Cristo “na cruz”? Seria NECESSARIAMENTE diferente falar de Cristo crucificado e falar de Cristo ressurreto? Em princípio, pode parecer que sim, que “crucificado” se refere a alguém “na cruz”. Mas, você já percebeu que, quando encontram um homem morto, podem falar dele como “eletrocutado” ou “afogado”? Não é difícil imaginar alguém dizendo: “Acharam o corpo de um homem decapitado” ou “O homem esquartejado foi colocado dentro da mala”. Enfim, mesmo em português, utilizamos um particípio passado para falar de algo que aconteceu à pessoa e que foi causa de sua morte, mesmo depois de sua morte. Mais fácil é perceber isso considerando o texto grego do NT, que apresenta um particípio perfeito (resultativo) passivo, ἐσταυρωμένος, nos trechos em que as traduções apresentam “crucificado”. A tradução poderia ser até mesmo “que foi/fora crucificado” em alguns casos. A ação descrita pelo verbo não precisa estar em desenvolvimento. Ora, em Ap 5.12, lemos que o Cordeiro MORTO é digno de receber o poder [ἄξιόν ἐστιν τὸ ἀρνίον τὸ ἐσφαγμένον λαβεῖν τὴν δύναμιν] etc.? Esse Cordeiro está morto? Ou foi/esteve morto? Voltando, todo homem “crucificado” está “na cruz” ou pode ser o caso de ele ter estado na cruz e assim ter morrido? Uma resposta muito clara está em Mt 28.5 / Mc 16.6. Um anjo comenta com as mulheres que procuravam o corpo de Jesus: οἶδα γὰρ ὅτι Ἰησοῦν τὸν ἐσταυρωμένον ζητεῖτε. “Eu sei que vocês procuram Jesus, o (que foi) crucificado.” Ora, o objeto da busca das mulheres não é um homem preso a uma cruz, mas o corpo de um homem que passou pela crucificação. Eventualmente, como no famoso caso arqueológico de Yehohanan filho de Hagakol, elas poderiam encontrar um cravo de ferro ainda no corpo sepultado. A crucificação deixa traços, se não tão concretos, ferimentos característicos ao menos. (O afogamento, a decapitação, a eletrocussão etc. também.) O morto é alguém (que foi) crucificado [ἐσταυρωμένος], mesmo não estando na cruz. Por isso, a meu ver, o assunto “Cristo crucificado” não é necessariamente diferente do assunto “Cristo ressurreto”. Falar de Cristo crucificado não é necessariamente falar somente de Cristo na cruz. O Cristo ressurreto é o Cristo crucificado.
0 Comments
Leave a Reply. |
O autorCesar Motta Rios é teólogo. Tem Doutorado na área de Literaturas Clássicas e Medievais, com pós-doutorado na área de Filosofia Antiga. Exerce ministério pastoral junto à Igreja Luterana em Miguel Pereira - RJ. Para acessar seu currículo e encontrá-lo em outras plataformas, clique AQUI. Histórico
April 2023
|