17º Domingo após Pentecostes – 2019 (Sábado: Culto da Juventude)
Comunidade Luterana Concórdia – São Leopoldo, RS NOSSAS LÁGRIMAS E O EVANGELHO: O MOTIVO DE CONTINUAR EXISTINDO IGREJA Habacuque 1.1-4;2.1-4 e 2 Timóteo 2.1-14 Cesar Motta Rios Nós vamos conversar sobre dois momentos históricos completamente diferentes, distanciados por mais de 600 anos um do outro. No primeiro, o profeta Habacuque conversa com Deus sobre uma situação insuportável. Um povo sofre. No segundo, o apóstolo Paulo conversa com Timóteo sobre uma situação incômoda. Uma pessoa sofre. Em ambos os diálogos, o Evangelho surge como a melhor resposta. E é isso que vai me possibilitar conectar os dois textos. Habacuque O profeta Habacuque reclama com Deus sobre a violência que o povo vem sofrendo. Isso no trecho que lemos no capítulo 1. A resposta de Deus prenuncia mais violência, mais pavor. E Deus mesmo se coloca como o agente por trás da história. Ainda no capítulo 1, Habacuque argumenta. Reconhece que Deus levanta o inimigo de modo a exercer disciplina, mas pergunta até quando. Questiona sobre um limite e clama: “Por que tratas as pessoas como se fossem peixes do mar, como se fossem animais que rastejam, que não têm quem os governe?” Ele tem urgência. Pessoas estão morrendo! Depois de expor sua consternação, o profeta diz que ficaria ali postado, vigiando para esperar a resposta de Deus, para ver o que Deus diria. Isso já no trecho lido do capítulo 2. Há algo muito importante a ser considerado aqui. Em meio à revolta e ao desespero diante das maiores dores da vida, algumas vezes, nós podemos deixar de atentar para a resposta de Deus, quando é exatamente isso que precisamos fazer. E qual é a resposta. Deus sabe que a situação é mesmo extrema. Mas anuncia salvação em meio à angústia. E reluz para nós a frase por todos conhecida: “Mas o justo viverá pela sua fé”. Viverá! Aqui, podíamos pensar que se trataria simplesmente de sobreviver aos conflitos daquele tempo, mas o apóstolo Paulo nos fará ver que se trata de muito mais. “O justo viverá pela sua fé” trata de um viver além de todo conflito, de toda precariedade. É a vida verdadeira e sem fim que está em vista, mesmo no meio de um mar de aflições, mesmo num contexto histórico bem específico e sofrido. Paulo Tendo mencionado Paulo, convém falar sobre sua carta ao jovem Timóteo. Essa segunda carta revela um Paulo assombrado pelo abandono. Preso, ele fora já deixado de lado por vários colaboradores. Por isso, de modo insistente e quase repetitivo, ele exorta Timóteo a não se desanimar e a não se envergonhar. Esse jovem não vive uma vida sem rumo, desconectada de tudo que realmente importa, anestesiado por ilusões. É um jovem que enfrenta a realidade com lágrimas, mas que tem uma fé não-fingida. Ele conhecera Paulo em atividade, livre. Escreveu cartas junto de Paulo. Agora, essa referência, esse homem incansável, está algemado. Mas, Timóteo, não se envergonhe. Esse sofrimento não é motivo para alguém se afastar envergonhado. Pelo contrário, diz Paulo, “participe comigo dos sofrimentos”. Que convite! Ele só é possível de ser feito e bem ouvido por quem sabe que Deus sofreu na cruz, que Deus se revela não somente nas coisas belas, boas e agradáveis da vida, mas no seu contrário, na carência, na desolação, no abandono. Mas isso é algo de uma maturidade que não tem tamanho. O jovem Timóteo tem essa maturidade, não por capacidade própria, mas pelo Espírito. Paulo sabe disso. E é preciso que Paulo continue, que Timóteo continue, que nós continuemos e não nos envergonhemos. Por quê? Porque o Evangelho não é mensagem que se possa deixar de lado. É, antes, aquela mensagem que resolve o motivo de nossas lágrimas. Em um mundo em que tudo depende de condições, de permissões, de capacidades pessoais, a notícia que Deus dá é: “Eu aceito vocês como vocês são. Não precisam fazer pequenos sacrifícios, porque meu Filho já fez o sacrifício perfeito e suficiente por vocês. E, agora, vocês vão ter vida sem morte e sem lágrimas, simplesmente, pela fé”. “Ele não só destruiu a morte, como trouxe à luz a vida e a imortalidade, mediante o evangelho”. Habacuque reclamava das muitas mortes. O ser humano reclama da morte desde sempre. Deus diz que o justo viverá por fé. E isso fica às claras, iluminado e esclarecido pela vinda de Cristo e o claro anúncio do Evangelho. O ponto importante aqui é que a morte não é diminuída em seu poder de perturbação, de promoção do sofrimento. Não se trata de, por meio de argumentos filosóficos, existenciais, chegar a uma resignação e aceitação da finitude. A repulsa contra a finitude está no coração humano, que se estende com sua vontade para o infinito. Nós queremos viver sem fim. Então, a morte é dura e cruel. E pode ser encarada assim. Ter fim não é algo a ser aceito tranquilamente. Ter nossas relações rompidas de repente não é algo a ser tratado como normal. Somos seres para comunhão. Então, é para desesperar? É para não passar com calma e sobriedade pela experiência da morte perto de nós? É para vermos a morte com todo seu terror, e, assim, reconhecermos o valor do que Cristo fez por nós, reconhecer o valor do que Cristo faz por nós ao nos dar perdão, vida e salvação. Reconhecer a dádiva da vida e da imortalidade em toda sua grandeza. Nós Essa esperança foi anunciada pelos profetas, foi proclamada por Paulo e é para ser transmitida e vivida por nós. E, hoje, quando olhamos para nós mesmos e olhamos para o desânimo com relação à Igreja, e olhamos para os jovens, pensamos: o que será da Igreja nas próximas décadas? Eu acho necessário um pequeno acréscimo em nossa conversa, então. É preciso observar o que Paulo quer que mantenha Timóteo em movimento. Não é costume. Continue, porque é um bom costume. Se pensamos que a Igreja continuará por transmitirmos o costume de participar da Igreja aos nossos jovens, estamos enganados. Vir a uma Comunidade Cristã por costume ou tradição é algo que a geração que vem aí não vai fazer. Se alguém se ilude pensando que vai funcionar assim, desculpe-me por contar a verdade. Também, se pensamos que faremos as pessoas vierem para a Comunidade por termos oferta de entretenimento, estamos enganadíssimos. Isso podia funcionar há algumas décadas. Agora, o entretenimento é tão diversificado e acessível nas próprias casas e escolas, que não há essa vantagem na Igreja. Eles não permanecerão ou virão por ser legal. Por que é que as pessoas continuarão sendo Igreja e se reunindo em Comunidades? Porque há lágrimas. Porque há morte. Porque há uma Palavra contra a morte, e essa Palavra é Jesus Cristo. A Igreja continua simplesmente por sua Mensagem. E o que podemos fazer? Deixar essa Mensagem mostrar sua importância. Um detalhe: Paulo, que, no versículo 8, diz “não se envergonhe”, no versículo 12, diz “não me envergonho”. Voltamos à velha, mas sempre necessária questão do exemplo. O que os jovens veem em nós? Que valorização da Palavra, da Mensagem de salvação eles veem em nós? Eles veem só um costume ou um interesse na Igreja para entretenimento? Ou veem um amor por essa Verdade que liberta? Eles veem um apêndice em nossas vidas, algo do fim de semana? Ou veem a Palavra como aquilo que nos move de segunda a segunda? É algo que precisamos urgentemente avaliar em nós. Você pode dizer: “Para você é fácil dizer. Trabalhando com a Bíblia o tempo todo, suas filhas e os outros jovens vão ver...” Mas eu também preciso avaliar isso em mim e me preocupo. Será que, na intimidade do lar, elas vão ver um profissional da Bíblia ou alguém que ama até as últimas consequências a Mensagem de Cristo? Vão ver um hipócrita ou um servo? Vale para todos. Para os jovens, inclusive, porque são observados pelos pré-adolescentes, que são observados pelas crianças. Ser comunicadores do valor do Evangelho ou motivo de escândalo. Por fim Eu sei que o sermão pode parecer meio pesado para um dia leve como este. Mas, sinceramente, eu entendo que é urgentíssimo para todos nós, dos mais jovens aos mais velhos, revermos a importância que reconhecemos nessa mensagem ímpar, que é o Evangelho de Jesus. Essa mensagem é para ser o que há de mais especial para nós e retumbante em nós. É para lembrar a cada momento feliz ou absurdamente triste que nossa vida toda, com todas as suas fases e cores, se sustenta na cruz de Cristo e para ela se direciona. Definitivamente. Amém.
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O autorCesar Motta Rios é teólogo. Tem Doutorado na área de Literaturas Clássicas e Medievais, com pós-doutorado na área de Filosofia Antiga. Exerce ministério pastoral junto à Igreja Luterana em Miguel Pereira - RJ. Para acessar seu currículo e encontrá-lo em outras plataformas, clique AQUI. Histórico
April 2023
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