QUANDO O DEUS DA VIDA E DA COMUNHÃO TOCA A SUA CRIAÇÃO (Mensagem a partir de Marcos 7.31-37)9/5/2021 15º Domingo após Pentecostes – 2021
Missão Luterana em Miguel Pereira, RJ QUANDO O DEUS DA VIDA E DA COMUNHÃO TOCA A SUA CRIAÇÃO Marcos 7.31-37 Cesar Motta Rios Você já se imaginou surdo? Não ouvir nada do mundo ao redor, barulhos e vozes. Mais que isso: Você já se imaginou ser surdo e não conseguir falar direito, de modo inteligível? Como você se expressaria? Como as pessoas te veriam? Antes que você se lembre de língua de sinais, de legenda com descrição de áudio nos filmes e séries, em leis que facilitam o acesso ao mercado de trabalho etc., eu especifico: Imagine que você é cego e praticamente mudo no século I d.C.. E eu preciso contar que quem não escutava e falava não recebia educação. Na verdade, não era assim só no século I d.C.. Demoraria muito até que essa situação mudasse. Só no século XVI d.C., surge a iniciativa de alfabetizar surdos. Isso acontece primeiro na Espanha, por obra de um monge beneditino chamado Pedro Ponce de León, que educa um filho de nobres. Demoraria muito ainda até que escolas para pessoas com necessidades especiais surgissem na Europa. Então, você não ouviria, não conseguiria se comunicar com fala, não teria uma língua de sinais para que te entendessem, não poderia ler e escrever. Como você saberia das coisas? A visão ajuda a saber um pouco. Mas tem muita limitação. Se olho para o jardim, sei pelos olhos que está ventando. Isso sei. Mas como vou saber o que uma pessoa específica acha desse vento? Se ele estiver com feição de insatisfação, posso pensar que não gosta do vento. Mas e se for por outro motivo? Como vou saber? E, por outro lado, como a pessoa se expressaria? Fatalmente, não faria isso minimamente bem. Não é à toa que o mesmo termo usado em grego antigo (ἐνεός) para “mudo” é usado também para “estúpido”, “desmiolado”; tal era o “apreço” das pessoas nessa condição entre os antigos. Percebe que não é só o não ouvir e o não falar? É estar à parte do mundo das pessoas “normais”. É estar desconectado. É tentar entender tudo somente pelo que vê. Mas muita coisa não se entende somente assim. É pensar e pensar, estar preso em seus pensamentos sem a possibilidade de se expressar, de fazer entendida sua perspectiva, sua visão sobre cada assunto, sobre nada. É ser visto como um caso perdido, um ser sem grande valor. É uma pessoa assim que levam a Jesus. Ele não resolve tudo na frente da multidão. O homem em questão não seria objeto de um espetáculo. Jesus o retira dali. Então, por sua palavra, faz que esteja são. O homem, agora, ouve e pode falar direito. Jesus diz que as pessoas que presenciaram o ocorrido não deveriam espalhar por aí a notícia. Mas elas fazem isso. E é compreensível. O acontecimento é marcante demais para passar sem ser contado por todos os lados: “Ele já fez tudo muito bem! Até os surdos faz ouvir e os sem fala faz falar!” Essa é a presença daquele por meio de quem tudo que foi feito se fez. Daquele que estava no princípio, quando, sobre a criação, nós escutamos: “E viu Deus que era bom!” E era mesmo. O que perturbou a criação e sua qualidade de boa foi o pecado. Por isso, há sofrimento, pesar, dificuldades sem fim. Mas Jesus diante do homem sofrido pode fazer conforme foi feito no princípio. E o ser humano ouve e fala, como Adão e Eva antes dele. Assim, Jesus devolve a criação à sua condição devida. Faz isso na vida de um, anunciando que o fará na vida de todos para todo sempre. Aquele que estava na primeira criação, vem para instaurar a Nova Criação, em que não haverá mais limitações como surdez, cegueira, pressão alta, diabetes o que quer que seja! Ele vem e faz tudo novo. Mas há mais do que saúde em jogo aqui. O sujeito que não ouve e não fala, naquele tempo, como já bem imaginamos, está isolado, não tem essa comunhão tão simples e fundamental que nós temos ao podermos falar e ouvir, expressar pensamentos e ter informações sobre o que vem acontecendo e o que outros estão pensando. Não. Ele é um ser enclausurado. Então, a presença de Jesus não só o coloca são, mas o coloca em comunhão. Vínculos, agora, podem ser tecidos, e já começam na própria proclamação do ocorrido. O homem que aparece mudo. Agora, pode expressar o que viveu, o que sabe, o que experimentou. Ele pode falar e ser ouvido. Pode ouvir e entender. Ele é mais um vivo para a comunhão. Deus gosta de sua criação. Deus gosta de comunhão. Ele quer reconciliar as pessoas com ele mesmo. E quer reconciliar nossos laços. “Para que sejam um” – diz Jesus. Você pode pensar: “Mas quem sou eu para ele querer isso para mim? Eu não sou nada.” Então, nós nos lembramos: Deus criou o universo a partir do nada. Isso não é problema para ele. Podemos confiar. Não haverá mais desconexão. Não haverá mais choro incompreendido. Não haverá mais solidão e desentendimento sem fim. Porque Jesus chegou. Porque Jesus tocou de novo a criação, e derramou seu sangue. Nós temos ouvidos para ouvir? Ouçamos o que ele diz. Nós temos voz para falar? Falemos do amor desse que fez e faz tudo bem. E viveremos o verdadeiro banquete de Deus. Banquete de vida e comunhão! Amém.
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O autorCesar Motta Rios é teólogo. Tem Doutorado na área de Literaturas Clássicas e Medievais, com pós-doutorado na área de Filosofia Antiga. Exerce ministério pastoral junto à Igreja Luterana em Miguel Pereira - RJ. Para acessar seu currículo e encontrá-lo em outras plataformas, clique AQUI. Histórico
April 2023
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