"Façamos o homem": esse "nós" se refere à Trindade ou a Deus com os anjos - Lutero e Rashi7/11/2018 “Façamos o homem”: esse "nós" ser refere à Trindade ou a Deus com anjos - Lutero e Rashi
Cesar M. Rios Nos primeiros capítulos do Gênesis, Deus costuma inserir-se em um “nós” que permanece sem explicação: “Façamos o ser humano à nossa imagem...” (1.26) ou “se tornará como um de nós” (3.22). As interpretações judaica e cristã tomam caminhos radicalmente diferentes. Aqui, exemplifico o fato com Lutero e Rashi. Enquanto Lutero encontra um ensino (ainda pouco claro, ele reconhece) da Trindade, Rashi entende que Deus fala com anjos. Rashi viveu no século XI, na França. Seu comentário para a Torah tem a vantagem de ser bastante conciso e direto. Comentando Gn 2.26 e 27, ele ressalta a humildade de Deus, que, sendo maior que toda a criação, decide tomar conselho de seres menores. Rashi ainda observa que “heréticos” usam o plural para defenderem seus pensamentos. Por fim, anota que, como refutação contra os hereges, está escrito logo após esse verso “E criou o ser humano”, e não está escrito “E criaram” (וַיִּבְרָא אֶת הָאָדָם, וְלֹא כָתַב וַיִּבְרְאוּ ). Alguns séculos depois, em terras germânicas, Lutero proferirá suas lições sobre Gênesis tendo em atenta consideração os comentários de Nicolau de Lira. Quanto à presente questão, Lutero diz que Lira se equivocara ao seguir os judeus na interpretação do plural “nós”: “Rejeite-se, pois, o erro dos judeus, que Lira adota nesta passagem, e se decida pelo sentido literal de que em Deus há uma pluralidade.” Adiante, concluirá: “Nossa opinião também é apoiada nesta passagem pelo nome de Deus, Iehova, que não pode significar nenhuma criatura, mas é atribuído somente e apenas ao próprio Criador. Mas que diz o Criador? Apenas isto: “Adão tornou-se como um de nós”. Aqui, certamente, nossa religião e fé não permitem que aceitemos isso como se fosse dito aos anjos. Pois quem dirá que Deus é um dentre os anjos ou um anjo dentre Deus? Pelo contrário, Deus está acima dos anjos e acima de todas as criaturas. Como, portanto, se poderia equipará-lo aos anjos?” Anteriormente, no comentário sobre Gn. 1.26, Lutero havia afirmado diretamente: “Mas eu pergunto: por que ele não fez isso antes? Em segundo: que a criação dos seres humanos tem a ver com os anjos? Em terceiro: ele não cita os anjos, mas simplesmente diz “nós”. Portanto, ele está falando de [pessoas] que fazem e criam. Isso, certamente, não se pode dizer dos anjos.” Em quarto lugar, também isto é certo: de modo algum pode-se dizer que nós fomos criados à imagem dos anjos. Em quinto: usam-se aqui “façamos” e “fez”, no singular e no plural”. Com isso, Moisés mostra de forma clara e convincente que, na única essência divina, que criou tudo, existe uma pluralidade criadora indivisível.” Alguns detalhes interessantes me ocorrem a partir dessa comparação:
---------------------- O comentário de Rashi está disponível aqui: https://www.sefaria.org/Rashi_on_Genesis?lang=bi O de Lutero, eu o acessei no volume 12 das Obras Selecionadas, publicadas em parceria pelas editoras Concórdia, Sinodal e Ulbra.
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A PROFECIA DE EZEQUIEL 47 ESTÁ SE CUMPRINDO? COMO? Uma amiga me mandou o link desse vídeo. O religioso diz que o que se vê é cumprimento da profecia de Ezequiel 47. Há uma série de vídeos em inglês dizendo a mesma coisa no Youtube. Então... Ela pede um comentário de minha parte. Eu estou com certa dificuldade. Primeiro, porque precisaria de mais entendimento sobre o que está acontecendo. O pessoal só diz que "cientistas não sabem explicar". Cientistas, médicos ou outros especialistas não sabendo explicar coisas sempre é, para muitos, indicativo de que algo sobrenatural está em desenvolvimento. Às vezes, eles explicam, mas dizemos que não. Às vezes, só não explicam AINDA. Às vezes, explicam, mas estão errados e não sabemos. Enfim, é um critério complicado. Em segundo lugar, eu precisaria entender o processo de leitura desse pessoal. O texto de Ezequiel 47 fala de um rio fluindo desde o Templo. Não fala de buracos se abrindo com água aqui e ali. Ou seja, o resultado pode começar a parecer semelhante, mas o modo é bastante diverso. Deveríamos ler o "modo" de modo mais livre, e o resultado de modo mais literal? Por quê? Eu tendo a ler toda aquela imagem de Ezequiel 47 de modo simbólico. E eles? Parece literal, mas só até certo ponto. O que quero dizer é: Se me mostrarem um rio fluindo de Jerusalém e mudando as águas do mar Morto, vou dizer: "Uau! É literal!" Se é só o que está acontecendo ainda, vou dizer: "Hum... interessante o fenômeno. E há alguma semelhança curiosa com a profecia. Vamos esperar para entender isso melhor." E quero entender isso melhor mesmo. Se alguém tiver opinião mais esclarecida, eu agradeceria que aparecesse nos comentários. Sem sensacionalismos, por favor. Enquanto isso, coincidentemente, continuo meu trabalho sobre "água viva"/"água da vida" na Bíblia. Publiquei um artigo no ano passado, focando no Quarto Evangelho ( http://periodicos.est.edu.br/…/estudo…/article/view/2927/pdf ). Outro, que comecei a escrever, focando no Apocalipse, deve ficar pronto para o ano que vem. |
O autorCesar Motta Rios é teólogo. Tem Doutorado na área de Literaturas Clássicas e Medievais, com pós-doutorado na área de Filosofia Antiga. Exerce ministério pastoral junto à Igreja Luterana em Miguel Pereira - RJ. Para acessar seu currículo e encontrá-lo em outras plataformas, clique AQUI. Histórico
April 2023
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