[O texto abaixo foi escrito em setembro de 2014. Na verdade, como se percebe, é constituído por duas respostas destinadas a um certo Alex. Por aquele tempo, o rapaz acusava a equipe do eteacher.edu (da qual eu fazia parte) por não pronunciarmos Yeshua, mas Jesus em nossas aulas.]
Oi Alex, Vou te dar uma resposta curta, mas não por falta de consideração. Nossa conversa pode continuar aos poucos. Eu entendo que a questão que você levanta é problemática porque a reação ou resposta de cada um a ela não depende só de conhecimento, mas também nossas crenças. Por isso, antes de dizer o que acho e porque entendo que não estamos fazendo nada de errado ao dizer "JESUS" e "JERUSALÉM", preciso dizer que: Não creio que o uso das palavras tenha poder mágico ou místico, no sentido de que, por exemplo, uma pronúncia correta do nome do Cristo possibilitaria uma invocação melhor respondida pela divindade. Se eu cresse nisso, minha resposta seria outra. Pois bem, estando em um país de fala inglesa, me chamam "Cisar". Estando em país de fala hispânica, me chamam "Cêssar". Uma vez tentei ensinar uma alemã a pronunciar meu nome. Ela se esforçou, mas a tônica ficou no A: CesAR! Mesmo meu nome sendo mal pronunciado, eu não deixei de ser eu, nem deixei de responder ao chamado. Por quê? Porque sei das peculiaridades dos idiomas dessas outras pessoas e reconheço uma certa impossibilidade de que pronunciem meu nome tal qual minha mãe o pronunciou desde meu nascimento. Eu digo "JESUS". Por quê? Ora, porque sou herdeiro de um processo LINGUÍSTICO e puramente LINGUÍSTICO que faz com que o nome semita do Salvador seja assim pronunciado em português. No Novo Testamento grego o nome dele já é pronunciado diferente do que sua mãe pronunciava, pois falta ao grego o som "sibilante palato-alveoar desvozeado ", que no hebraico é representado pelo shin - שׁ. Solução? Coloquemos um sigma - σ, com som "sibilante-fricativo alveolar desvozeado" (som de dois s em português), pois é até parecido. Paulo (judeu-fariseu-da tribo de Benjamin-circuncidado etc etc etc) não morreu de remorso por isso. Mesmo sabendo da diferença, escreveu suas cartas em grego, utilizando para "Jesus" o mesmo nome que os tradutores judeus mais antigos haviam usado para (o personagem que chamamos de) "Josué" na Septuaginta (Ἰησοῦς por יְהוֹשֻׁעַ). (Se Paulo fez isso, eu não posso fazer?) Vamos lá: O passo seguinte foi o latim, que tomou o som do grego e o manteve praticamente inalterado. Mas o "J" do latim (que encontramos nas edições de textos em latim) não tinha o som "sibilante palato-alveolar vozeado " que tem hoje em português. Era simplesmente um i em posição de semivogal. Com o tempo, e com a diversificação do latim em línguas populares no amplo espaço em que era falado, o som do J se diversificou (Algo normal. Veja como a pronúncia do R se diversificou muito nos diversos lugares em que se fala português, por exemplo.). Compare a pronúncia do português e do espanhol para o J. Bem, coube a nós o som que temos. "Jesus". Ele sabe que é dele que estamos falando? Sim. Creio que sim. Tanto quanto eu sei que sou eu quando meus colegas falantes de inglês me chamam de "Cisar". Agora, se eu quiser estudar um texto, tentando entender a etimologia das palavras, não posso ler tradução, transliteração, nem discutir a partir disso. Precisarei ir ao texto em sua língua de origem. (Por isso não faz sentido pensar em transliteração reversa.) Mas estudar etimologia é uma coisa, falar sobre um assunto, ensinar em uma aula ou cultuar em uma igreja são coisas diferentes. O problema é que há certas teorias da conspiração que inventam que as mudanças linguísticas são maquinações perversas de forças ocultas. Não creio nisso. Se temos uma explicação simples, por que procurar outras pouco prováveis? Bom, eis minha opinião e o motivo de minha pronúncia e escrita. Mas respeito quem pensa e pronuncia diferente. Eu entendo. O Senhor certamente nos entenderá muito mais. Abraço, Cesar [Após uma tréplica] Alex, Toda pesquisa pode, em princípio, não ter bom resultado. Geralmente, isso acontece por problemas na metodologia adotada. Por isso, no âmbito acadêmico-científico, um pesquisador começa sua formação acompanhado por um orientador. Esse orientador avalia os passos, acerta desvios, faz atentar para erros pontuais que vão desencadear em conclusões precipitadas. Só depois de Mestrado e Doutorado sob orientação, o pesquisador é considerado habilitado para desenvolver pesquisas de modo independente e autônomo. Mesmo assim, é altamente aconselhável que se ajunte a um grupo de pesquisa e divulgue seus resultados parciais entre outros pesquisadores, para que, no diálogo com os pares, imperfeições sejam identificadas. Vejo em sua pesquisa um possível problema duplo: 1) problema na seleção / avaliação das fontes secundárias; 2) problema na apreciação das fontes primárias. As fontes secundárias são os estudos produzidos por outros. Você parece aproveitar de um tipo de material que tem feito muito sucesso em blogs, sites e no Youtube. Contudo, esses estudos muitas vezes (na verdade, na maioria absoluta das vezes) não são produzidos por pessoas com formação adequada ou com critérios metodológicos pertinentes. Frequentemente, têm caráter mais polemista ou de divulgação que propriamente acadêmico. Quanto às fontes primárias, é preciso verificá-las com atenção e tempo. O nome Ἰησοῦς aparece primeiro na Septuaginta para o nome יֵשׁוּעַ (Exemplo de Êxodo 17:10: καὶ ἐποίησεν Ἰησοῦς καθάπερ εἶπεν αὐτῷ Μωυσῆς ...). E o mesmo nome é usado posteriormente pelos seguidores do Messias para escreverem seu nome em grego no NT. O apóstolo Paulo escreveu suas cartas em grego e usou essa palavra, como eu já disse antes. O nome grego, então, não é Iesua como você diz. Logo, Jerônimo, que certamente sabia mais hebraico e grego que nós dois, não passa de Iesua ou Ieshua para Iesus. Ele passa de Ἰησοῦς, que foi usado no Novo Testamento em sua língua original, para Iesus, que tem o mesmo som do termo em grego! O S final, então, chega ao português direto do Latim, que o tomou do grego, e que provavelmente o colocou ali para adequar o nome ao esperado de um nome de homem em grego. Você diz: “Alguns estudiosos acreditam que o padre Jacobus , homenageando o deus jupter. por anos . segundo relato.” Eu fico pensando: que tipo de estudioso? Eles têm formação oficial na área de linguística, estudos da Bíblia ou teologia? Tem currículo na plataforma Lattes (caso atuem no Brasil)? Imagino que não. Geralmente, essas coisas são “acreditadas” não por verdadeiros estudiosos, mas por sensacionalistas com aparência de estudiosos. É o problema das fontes secundárias duvidosas, que eu orientaria você a abandonar prontamente. Quanto ao verso que você cita de Ezequiel: וַיָּב֗וֹא אֶל־הַגּוֹיִם֙ אֲשֶׁר־בָּ֣אוּ שָׁ֔ם וַֽיְחַלְּל֖וּ אֶת־שֵׁ֣ם קָדְשִׁ֑י בֶּאֱמֹ֤ר לָהֶם֙ עַם־יְהוָ֣ה אֵ֔לֶּה וּמֵאַרְצ֖וֹ יָצָֽאוּ׃ Eu simplesmente não vejo relação disso com o nome de Jesus. O NOME em questão é o nome divino por excelência, escrito pelo tetragrama, que aparece claramente como o tema do verso na parte final. Com todo respeito e com toda a tranquilidade, já que você pergunta minha opinião, eu digo que entendo que sua pesquisa te levou a uma conclusão equivocada sim. E eu entendo que minha exposição demonstrou isso. Mas aí vem a questão da crença de cada um, que deve ser respeita. Se você acredita que Satanás (eu, como você sabe, uso os termos na forma tradicional do português mesmo) tem interesse na pronúncia diferente do nome de Jesus, que isso está na agenda dele, você pode acabar entendendo que meus argumentos são mobilizados por ele, no intuito de desviar a muitos da verdade. Preciso respeitar isso. Crendo que certamente não estou sendo movido pelo capiroto, fico tranquilo por ter exposto minha perspectiva, que é a de muitos, se não da maioria dos estudiosos que abordam o assunto. Espero que eu tenha sido capaz de fazer com que você suspeite que sua pesquisa precisa de uma revisão. Abraço! Cesar
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O autorCesar Motta Rios é teólogo. Tem Doutorado na área de Literaturas Clássicas e Medievais, com pós-doutorado na área de Filosofia Antiga. Exerce ministério pastoral junto à Igreja Luterana em Miguel Pereira - RJ. Para acessar seu currículo e encontrá-lo em outras plataformas, clique AQUI. Histórico
April 2023
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